Criação, pesquisa, e educação em arte e ecologia do SER.
Instalações, ações coletivas, produções audiovisuais, imagens digitais, fotografias.


COMO?

COMO?

Como obter situações que permitam subverter poeticamente as restrições espaço-temporais, que rompam com as referências habituais, e proponham a vivência perceptiva de uma estreita interação entre sujeito, espaço e tempo, onde um presente contínuo, suspenso e ampliado, que contenha movimento, pulsação e ritmo, possa ser experimentado? Os interstícios, as zonas híbridas de transição entre o objeto e a luz, entre a pausa e o movimento, entre o sujeito e o espaço-tempo, são lugares entre, estreitos, mistos e contaminados, carregados de tensão por estarem nos limites de territórios que se confrontam; constituem zonas vibrantes de comunicação e transformação. Alcançar uma condição de estar DENTRO do ENTRE, dentro de uma zona intersticial de sobreposição, e expandir esta zona de contato seria uma estratégia para reconfigurar o corpo e integrá-lo melhor à percepção, reunir sensibilidade, sensação e intelecto, obter a fruição do corpo vivo em um estado de consciência e de afetividade amplificados? Como experimentar o ato de EXISTIR com o corpo todo desperto, e alcançar um ESTADO DE SER no qual experiência direta e indireta já não se diferenciam, onde externo e interno estão entrelaçados, onde há uma simbiose entre corpo, espaço-tempo e alteridade? O grande desafio é incorporar o não controlável através do improviso com inteligência, alcançar uma situação vibrante, sensível, sutil e criativa de sincronicidade entre o SER e o ESTAR, um espaço-tempo ontológico do self entre a memória e a entropia, no qual possa haver uma fusão, um lugar que reúna o sujeito e o meio, onde a percepção do estado de existir, tanto na condição de indivíduo como na de parte de um coletivo, seja simultânea e intensificada.

Mas COMO?

Monique Allain


ALGUMAS PALAVRAS

Os trabalhos são uma forma poética de pensar as relações entre o homem, os espaços que cria e transforma e o movimento decorrente desta dinâmica, dentro de uma dimensão privada e pública. O tripé arte, biologia e filosofia é o motor de criação.

O interesse pela biologia e pelas questões ambientais conduziu à escolha da formação inicial em ciências físicas e biológicas, da posterior atuação profissional como consultora ambiental, e sedimentou-se no processo de desenvolvimento artístico. A produção incorporou conteúdos que envolvem noções de sustentabilidade, de consciência pelo movimento, e da biologia do SER.

Partindo de uma compreensão do espaço como corpo e do corpo como espaço, as potencialidades sinestésicas da imagem digital são exploradas e funcionam como trabalhos autônomos ou como elementos-base para composição de diálogos, situações de encontro e de troca, tais como performances, intervenções urbanas, ações coletivas, instalações audiovisuais e “habitações". As propostas privilegiam a participação do público.

A hibridização de meios diversos, desde a pintura ao vídeo, à fotografia e à outras tecnologias digitais é um recurso constante e revela um território convergente nas diversas formas que a imagem hoje assume. Torna-se difícil diferencia-la em categorias, tanto no que diz respeito à técnica como ao modo de representação e apresentação. Assim, natureza e origem se perdem, os limites entre realidade e ficção, entre materialidade e virtualidade se dissolvem.

A intenção é propor vivências que possibilitem um mergulho “dentro do entre”, em zonas de transição e sobreposição (entre o objeto e a luz, entre a pausa e o movimento, entre a realidade e a imagem). Esses lugares estreitos e não rotulados são instáveis e oferecem um amplo potencial de comunicação e de transformação. Habita-los pode ser uma forma de expandi-los. A atmosfera criada através do diálogo entre os sons e imagens, geralmente em grandes formatos, visa subverter poeticamente as restrições espaço/temporais, romper com as referências habituais e propor a vivência perceptiva de lugares onde a integração entre sujeito, espaço e tempo aconteça de outras maneiras, onde um presente contínuo, suspenso e ampliado possa ser experimentado. Procura-se obter com isso, a fruição do corpo vivo em um estado amplificado de afetividade e percepção consciente, de modo a alcançar um “estado de ser” no gerúndio (“state of being”, termo empregado pelo artista Robert Morris), no qual a experiência direta e a indireta já não se diferenciem, onde externo e interno estejam entrelaçados e haja uma simbiose entre corpo, espaço-tempo e alteridade. Deste modo, talvez se possa alcançar uma maior sincronicidade entre o SER e o ESTAR, um lugar que reúna em um plano comum o sujeito e o meio, onde a percepção do estado de existir, tanto na condição de indivíduo como na de parte de um coletivo, seja intensificada.

Monique Allain

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

20160901 - MÉXICO IMAGINÁRIO: UM LIVRO ABERTO



Registros da vitrine

FICHA TÉCNICA
Instalação
Local: Vitrine da ABER - Rua Dr. Bráulio Gomes, 139 - Centro - São Paulo
Período: 03/09 a 09/10
Curadoria: Ana Roman  

2016

SINOPSE

O eixo da instalação consiste em um painel de azulejos impressos, com as imagem que se vê ao abrir o livro MÉXICO IMAGINÁRIO: MEMÓRIAS HERDADAS VIVIDAS E INVENTADAS nas páginas 18 e 19. A imagem é uma composição feita com o registro fotográfico da instalação Híbrido, obra apresentada em 2014 na exposição coletiva do 11o Festival da América do Sul, no SESC de Corumbá. O prato e as bolinhas concebidos para a instalação, são também expostos na vitrine, e resultam da queima de argila misturada com cacos de porcelana e óxidos.
 
 Esquema da vitrine.



Imagem impressa em 24 azulejos 15 x 15 cm para composição de painel

Painel 1
Híbrido na parede
Painel composto de 24 azulejos impressos com imagem digital
60 x 90 cm
2016  

Ao lado do painel de azulejos, há um segundo painel de dimensão iguais ao primeiro, com as páginas 16 e 17 do mesmo livro, ampliadas e impressas sobre papel.

 
Imagem que compõe o segundo painel.

Painel 2
Página impressa
Impressão digital ampliada sobre papel das páginas 16 e 17 do livro México imaginário: memórias herdadas, vividas e inventadas.
60 x 90 cm
2016


Prato

Híbrido

Prato  e bolinhas resultantes da queima de argila misturada com cacos de porcelana e óxidos

22 x 15 cm

2014

Obra concebida para exposição do 11o Festival da América do Sul. Foi assinada com o heterônimo Maria Palomino. A quebra posterior, ocorreu durante o transporte de volta à São Paulo.


O livro está presente, apoiado em uma prateleira. 


 
México imaginário: memórias herdadas, vividas e inventadas

Livro


Livro de artista

22 x 15 cm

36 páginas

2016

Impressão e acabamento: Gráfica Águia

  Completando a instalação, um vídeo de Regina Jehá apresenta depoimentos da artista sobre as motivações que alimentaram o projeto México Imaginário.

Mini DVD player com vídeo.

Vídeo
Depoimentos em vídeo de Monique Allain sobre as motivações que alimentaram o projeto MÉXICO IMAGINÁRIO.
Direção e câmera: Regina Jehá
16 min
2016

TEXTO CURATORIAL DE ANA ROMAN
Comer a si e ao outro

Distinguimos alimento e comida a partir de práticas sociais que circundam a nutrição do ser humano: o alimento se relaciona com o que ingerimos para manutenção da vida, e, portanto, tem caráter mais universal, já o conceito de “comida” implica em hábitos alimentares e na ritualização das refeições. Lévi-Strauss, em O Cru e o Cozido, afirma que as alterações no preparo dos alimentos implicam historicamente em importantes mudanças culturais, pois o cozimento se relaciona a um maior grau de organização das populações e ao nível de comensalidade entre os indivíduos. Assim, podemos dizer que as identidades de um grupo, uma classe e mesmo de uma pessoa, determinam e são determinadas pelo ato de comer e pelos objetos triviais utilizados nessa ação. Pratos configuraram, nesse sentido, espaços a partir dos quais construímos nossa história e cultura.

Em México Imaginário, Monique Allain estampa azulejos com a imagem de um prato concebido para a instalação Híbrido (2014). O objeto retratado na azulejaria – e seu correspondente escultórico presente na instalação – é composto por fragmentos de cerâmica e porcelana, que conformam uma superfície utilizada como suporte para o alimento no ato de comer. 

A cerâmica remete às práticas nativas ameríndias de feitura de utensílios e ao universo do artesanato - rebaixado à categoria de arte menor, e visto como uma prática feminina de pouco interesse - enquanto a porcelana simboliza a metrópole ocidental colonizadora e civilizada.  Ao se encontrarem, os dois materiais produzem uma superfície heterogênea que carrega memórias e rastros do processo não só de feitura da peça, mas também da colonização na América: a violência do processo colonial e a posição ocupada por nosso continente no sistema-mundo se inscrevem neste trabalho e revestem as paredes da instalação. O prato é aquilo que contém, mas também aquilo que é comida.
As imagens evocadas pelo trabalho de Monique questionam o que Hélio Oiticica denominou de “convi-conivência” – o artista utilizava o termo para se referir à forma como nós, brasileiros, encaramos o passado colonial e a sociedade desigual dele advinda. Em México Imaginário, fricções e justaposições que compõe a história e o imaginário mexicano são expostas na pele construtiva do espaço e na colagem que conforma o prato.
O hibridismo cultural latino-americano ressoa ainda no livro que compõe a instalação. O livro-dentro-de-um-livro; e a “ busca por um hospedeiro”, nas palavras da artista, são metáforas para as consequências não somente da colonização ameríndia, mas das trocas culturais contemporâneas entre as populações. A identidade torna-se uma impossibilidade em um contexto em que o eu e o outro se diferenciam e se assimilam constantemente.
Os fragmentos de México Imaginário são reveladores das justaposições que nos estruturam enquanto sujeitos. A construção de nossos imaginários e discursos resulta em superfícies complexas e heterogêneas, como aquelas expostas no trabalho de Monique; nem cruas, nem cozidas e nem assadas; nem cerâmica e nem porcelana; mas como uma colagem de todas elas. 

SOBRE A INSTALAÇÃO - PALAVRAS DA ARTISTA
A obra exibida é fruto da integração de dois pensamentos: Por um lado, alinhada ao pensamento de Borges, apoia-se na compreensão de que o livro é uma extensão da memória do homem. Por outro, baseia-se na necessidade do sujeito transformar o lugar onde vive, de modo a torna-lo uma extensão de si mesmo. Assim ele se localiza e se reconhece (Milton Santos). Os revestimentos nas paredes, carregam sua história, suas recordações. São sua pele, ou o avesso da “pele” desse lugar que ele cria e marca com sua presença.
A instalação MÉXICO IMAGINÁRIO: UM LIVRO ABERTO é uma tentativa de habitar o espaço da vitrine, expandindo as memórias contidas no livro MÉXICO IMAGINÁRIO: MEMÓRIAS HERDADAS, VIVIDAS E INVENTADAS para além de suas páginas, impregnando as paredes do espaço com seus medos, crenças e afetos. Os azulejos, assim como os pixels da imagem digital, carregam cada qual uma identidade própria, e simultaneamente, juntos, compõem uma unidade que só é possível através do coletivo. 

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